25.03 – Água Fria
US de 40 semanas. A médica acha o líquido aminiótico diminuído, sugere falar com a GO. Mandei mensagem pra Ana Cris, que me pediu as imagens. “Pode ser que a gente tenha que induzir, mas vamos aguardar a consulta”. Chorei. Fracasso, incompetência. Meu corpo não sabia o que fazer? Não era possível que ele não soubesse que precisava entrar em trabalho de parto!
27.03 – Let it be
Era o dia do show do Paul, ele mesmo, o McCartney. Amanheci com cólica e com mensagem da doula perguntando se estava tudo bem. Já se passavam 4 dias da DPP e nada de bebê sair. Era também dia de pré-natal. Na consulta, queixei-me das dores. A fofa da Cibele parteira só me disse que a gente nunca sabia quando um trabalho de parto podia começar. E aí só não morri de raiva porque, como disse, ela é fofa. A obstetra Dani reviu os exames, me deu um novo pedido de US mas me acalmou, dizendo que não achava os valores ruins.
Uma amiga muito querida tinha vindo para o show. “Amiga, se ele cantar Let it be, grava pra mim?”. E eis que no fim da noite recebo aquele vídeo lindo. Assisti, me emocionei. E acho que corpo e bebê entenderam o recado: deixa acontecer!
A cólica permanecia e começaram algumas contratações. Fui para o chuveiro. Desta vez, diferente das outras, a dor permaneceu e as contrações ficavam cada vez mais intensas. O marido vinha e perguntava se era pra valer, se eu achava que fossem contrações mesmo. Na 3a aparição ameacei um soco na cara, ele se convenceu e ligou para a doula.
Quando a querida Thaís chegou, foi como o céu se abrindo e enviando um anjo, tamanho alívio que senti. Acupuntura, óleo essencial, bolsa quente, posições de alívio. Quanto apoio! Às 7 da manhã já sentia vontade de fazer força e ela deu o sinal pra irmos para o hospital. Que caminho sofrido! Senti cada freada (não sem xingar o marido motorista). Chegando lá, recusei cadeira de rodas, mas lembro-me de me agarrar ao totem enquanto liberavam minha entrada e um casal grávido que estava na recepção me olhava chocado de canto de olho.
Fui avaliada pela Mayara, médica do Coletivo. 8cm, ufa, já para a sala de parto. Logo acaba, pensei.
Salas de delivery todas ocupadas, seguimos para uma sala padrão, onde a equipe (Gabi, Luísa e Letícia, mais tarde, Ane) já nos esperava e que logo deixou muito aconchegante, com luz baixa, e com o que fosse necessário (bola, banqueta…). Bolsa se rompe, dilatação total assim que chegamos na sala de parto, e já sentindo os puxos, mas bebê ainda demorou mais 6h para nascer. 6h que não sei quanto tempo duraram. Perdi a noção. Tive total liberdade de movimentos, adotei as posições que meu corpo pedia. Sentei, andei, agachei, deitei-me no chão apoiada no marido. Ele e a doula se revezando no suporte. Equipe em um silêncio extremamente respeitoso e forte, cuidadosa. Eu, gritando “alguém me ajuda” e outros ais. Não quis analgesia. Tinha conversado com amigas que pariram com e sem, li muito, e tomei minha decisão. No fundo, queria conhecer meus limites. O alívio vinha quando a equipe monitorava e era possível ouvir o coraçãozinho da minha bebê batendo forte, forte. Em algum momento perguntaram se eu queria música, e acho que mandei catarem coquinho.
Eu já estava exausta. Perguntava em pensamento se não iam me oferecer logo o vácuo extrator. Então, mais uma vez com muito respeito, a equipe me propôs usá-lo para ajudar nossa Clarinha a sair. Isso mesmo, propôs, não houve imposição. “Manda ver”. Eu não aguentava mais. E então, com mais poucas forças e a sensação de que fosse morrer de dor (dor da qual já não me lembro), Clara chegou e veio para os meus braços. Segurar aquele corpinho foi inacreditável! Os olhinhos abertos me olhando, indescritível.
Pari na banqueta. A equipe me ajudou a me levantar com a bebê e passar para a maca, e ali ficamos, na nossa Hora Dourada, contemplando nossa família recém-nascida. Clara foi examinada no meu colo. Espertinha, logo encontrou o peito e mamou. E foi só depois que a placenta nasceu que o cordão foi cortado.
De tudo o que vivi, me marcou o respeito. O silêncio daquelas mulheres maravilhosas que me acompanhavam gritava “nós respeitamos você “. Senti-me segura, fortalecida, capaz de qualquer coisa. Hoje, meu desejo é o de que toda mulher tenha a chance de uma assistência e valorização como as que tivemos. Às equipes dos Coletivos Nascer e de Pediatras e à querida doula Thaís Olardi, gratidão infinita. Que muitas mulheres e bebês tenham a sorte de encontrar vocês! Ao papai, a pessoa mais terna que conhecemos, todo amor. Sem vocês, nós não teríamos conseguido.